terça-feira, março 13, 2007

Ouvindo Beethoven


Venham leis e homens de balanças,
mandamentos d’aquém e além mundo.
Venham ordens, decretos e vinganças,
desça em nós o juiz até ao fundo.
Nos cruzamentos todos da cidade
a luz vermelha brilhe inquisidora,
risquem no chão os dentes da vaidade
e mandem que os lavemos a vassoura.
A quantas mãos existam peçam dedos
para sujar nas fichas dos arquivos.
Não respeitem mistérios nem segredos
que é natural os homens serem esquivos.
Ponham livros de ponto em toda a parte,
relógios a marcar a hora exacta.
Não aceitem nem queiram outra arte
que a proeza do registo, o verso acta.
Mas quando nos julgarem bem seguros,
cercados de bastões e fortalezas,
hão-de ruir em estrondo os altos muros
e chegará o dia das surpresas.

José Saramago

2 comentários:

Tiago Ivo Cruz disse...

"...Faltará a música, que é sempre o melhor de tudo. Oxalá o leitor possa escutar, chegando bem o ouvido à página, aquela outra música que as palavras têm e que estas talvez não tenham perdido por completo."

José Saramago, posfácio da edição do seu libreto de "Don Giovanni o Il dissoluto Assolto", estreado em 2006 no Tetrao alla Scalla com música de Azio Corghi.

Sendo isto verdade, o seu contrário também o será, por isso pergunto que estavas tu a ouvir de Beethoven?

Abraço

Helena Romão disse...

Olá!
Foste descoberto!
Beijinhos,

Helena e Natasha